A pandemia do novo coronavírus, que teve início no mês de março, no Brasil, já alcançou números devastadores no país. Mais de 100 mil mortes, mais de 4,5 milhões de casos e uma quantidade imensurável de pessoas afetadas direta ou indiretamente no país e ao redor do mundo. Esses números, contudo, só puderam ser enfrentados pela existência de profissionais que não puderam ficar em casa para simplesmente parar o contágio da doença, mas tiveram que enfrentá-la face a face. Um desses profissionais foi Richardson Costa Martins.
Estudante do 4º período do curso de Enfermagem da Faculdade Florence, Richardson atua como técnico de enfermagem em dois hospitais de referência no combate à Covid-19 no Maranhão. Apesar de todo o medo, ansiedade e as dificuldades enfrentadas no dia a dia profissional, contexto que foi potencializado durante a pandemia da Covid-19, a luta por cada vida que chegou em suas mãos foi um impulso propulsor que o fez ter ânimo e dedicação para enfrentar a pandemia de frente e, hoje, contar à Faculdade Florence, com orgulho, um pouco dessa história.
Nesta, que é a segunda entrevista da série “Na Linha de Frente” da Florence, conheça a história deste que é mais um profissional que orgulha essa Instituição e toda a sua comunidade acadêmica.
Faculdade Florence – Conte um pouco da sua experiência no enfrentamento à Covid-19. Qual seu cargo e em que local você atuou com a Covid-19?
Richardson Martins – Eu sou técnico de enfermagem e atuo em dois hospitais de referência no combate à Covid-19 no Maranhão.
Bem, a pandemia da Covid-19 despertou em mim uma variedade de sentimentos, dentre eles o medo, a apreensão, a incerteza do anonimato de uma doença até então desconhecida que veio modificar minha rotina profissional. No entanto, me senti desafiado e na obrigação de ajudar a combater este mal que trazia pânico a todo o mundo. O sentimento de medo de contrair a doença era enorme, bem como de transmiti-la a meus familiares, mas, diante do caos que vivíamos, eu sentia que não poderia fugir da luta naquele momento, precisava enfrentar o inimigo e ajudar aqueles pacientes que tanto precisavam de suporte e atenção.
A batalha foi árdua, muito, e ainda está sendo. Eram inúmeras as dificuldades encontradas, falta de medicamentos, instrumentos de uso individuais, essenciais no combate da doença, bem como pouco conhecimento sobre tal. O cenário caótico era assustador, vários pacientes graves, outros nem tanto, além disso, o distanciamento familiar contribuía muito para o péssimo prognóstico desses doentes, era nítido o sentimento de solidão, incerteza, nos seus olhares. Com esses pacientes, o meu papel era trazer uma palavra de conforto, de atenção, cuidado, que pudesse amenizar o seu sofrimento. Para os demais, que naquele momento se encontravam em estado grave, intubados, pude pôr em prática todos os meus conhecimentos práticos e teóricos, proporcionando a eles o máximo de cuidado e conforto.
O sentimento de satisfação era enorme quando aquele paciente conseguia sair daquele quadro e, melhor, conseguia se recuperar da doença. Nossa, o coração pulsava forte de tanta emoção, era uma sensação de dever cumprido. Acredito que durante esse período pude dar o melhor de mim como profissional e pessoa, e, deste modo, pude contribuir no combate à doença.
Faculdade Florence – Qual o momento mais difícil que você enfrentou nesse período de enfrentamento ao coronavírus?
Richardson Martins – Foram vários os momentos de dificuldade, no entanto um dos mais marcantes, sem dúvidas, foi no pico da doença, quando o número de internação se potencializou e, consequentemente, houve uma sobrecarga hospitalar, bem como dos seus serviços. Além disso, a dor da perda de vários companheiros de serviço aumentava o sentimento de medo e tristeza, pacientes graves chegavam a todo momento, vários óbitos, familiares desesperados clamando por informações dos seus, o cenário era literalmente de guerra.
Os olhares de exaustão, medo e angústia refletiam a verdadeira realidade. Muitos colegas tiveram que se afastar, por serem do grupo de risco ou por terem contraído o vírus, ou doenças associadas. Apesar disso tudo, a união dos profissionais envolvidos era superior a seus sentimentos de apreensão. Poucas vezes ao logo da minha carreira profissional pude vivenciar uma união tão grande em prol de um único objetivo. Sem dúvidas, isso foi e ainda está sendo de grande relevância no combate ao sars-cov 2.
Faculdade Florence – Nesse período difícil, qual a sua motivação para seguir trabalhando em meio a esse cenário?
Richardson Martins – O meu maior estímulo certamente é a satisfação em poder ajudar, estar ali diariamente contribuindo na melhora dos meus pacientes. Além disso, o sorriso no rosto ao receber alta reflete o sentimento de gratidão. Nossa, não tem nada mais gratificante, não existe motivação maior do que isso para quem ama o que faz, cada paciente traz uma história e é imensurável a sensação de fazer parte dela.
Faculdade Florence – Algum paciente tocou o seu coração? Conte um pouco dessa história.
Richardson Martins – Cada paciente é especial e traz consigo uma particularidade, no entanto existem aqueles que mexem com os nossos sentimentos. A população idosa mexe muito comigo, me apego rápido e muitas das vezes preciso manter o profissional para não fraquejar diante dos casos. Tive oportunidade de cuidar de uma senhora de 87 anos, que iria realizar um procedimento cirúrgico de emergência e, naquele momento, encontrava-se muito nervosa e apreensiva, devido ao procedimento, bem como o medo de contrair a doença. Ao me aproximar, ela, segurando minha mão, com tom de choro, falou: ‘fica do meu lado, não me deixa sozinha’. Naquele momento fui pego de surpresa, confesso que a emoção foi tão grande que quase capotei em lágrimas, no entanto segui firme do seu lado e passei a ela toda atenção e apoio preciso. Graças a Deus essa senhora conseguiu sair bem da cirurgia e, no final, chorando, me agradeceu pelo apoio.
Faculdade Florence – Qual o maior aprendizado que você leva dessa experiência?
Richardson Martins – A pandemia da Covid-19 veio nos mostrar o quanto somos dependentes do outro, as nossas fragilidades, que não precisamos de datas comemorativas para desejar uma palavra amiga, um abraço, ou até mesmo um sorriso. O distanciamento veio transparecer aquilo que estava mascarado. E, sobretudo, a lição que devemos tirar deste cenário é, sem dúvida, que jamais devemos nos entregar diante das dificuldades, mas sim perseverar sempre, saber que unidos podemos fazer a diferença. Infelizmente ainda não foi encontrada uma vacina ou até mesmo uma cura para a doença, mas sabemos que, com o empenho de todos, vamos alcançar esse objetivo e vencer esse mal.